Romanos 3,20-31
Introdução
A passagem de Romanos 3,20-31 é uma das mais usadas pelos protestantes para defender a doutrina do “sola fide”, especialmente o versículo 28, que, em algumas traduções protestantes, aparece como:
“Sustentamos, pois, que o homem é justificado somente pela fé, sem as obras da Lei.” (Romanos 3,28 - Tradução Protestante)
Entretanto, a palavra “somente” não existe no texto original grego, e foi adicionada por Martinho Lutero em sua tradução da Bíblia para o alemão no século XVI. Esse fato foi tão polêmico que Lutero precisou se justificar em um escrito intitulado Carta Aberta sobre a Tradução (1530) 1, onde ele admitiu a inclusão da palavra mesmo sem ela estar no original.
“Se o seu papista quer incomodar-se bastante com a palavra ‘somente’ (sola), diga-lhe logo: o doutor Martinho Lutero quer assim, e diz que papista e asno é a mesma coisa. [assim quero, assim ordeno, tome-se a vontade por razão].”
Isso revela que:
A doutrina do “sola fide” não está explicitamente na Bíblia; foi introduzida artificialmente na tradução de Lutero.
Paulo nunca disse “somente pela fé”, mas falava da justificação sem as obras da Lei Mosaica.
Esse é um detalhe crítico porque muda completamente o sentido da passagem. Com a palavra “somente”, o texto parece excluir qualquer necessidade de obras; sem ela, permanece aberto para a compreensão correta da fé acompanhada das obras.
O Que Paulo Quer Dizer com “Obras da Lei”?
Para entender essa passagem, precisamos compreender o que Paulo quer dizer com “obras da Lei”.
“Obras da Lei” se referem às práticas da Lei Mosaica (circuncisão, regras dietéticas, rituais judaicos).
Paulo está combatendo a ideia de que essas práticas são necessárias para a justificação.
Ou seja, ele está ensinando que:
A salvação não vem da Lei de Moisés, mas sim da fé em Cristo.
Os judeus não são justificados só por seguir a Lei, e os gentios não precisam adotá-la para serem salvos.
Isso não significa que as boas obras em geral não são necessárias, mas que a justificação inicial vem pela fé, e não pela prática da Lei judaica.
Essa explicação é confirmada em Romanos 2,6:
“Deus retribuirá a cada um segundo as suas obras.”
Se Paulo estivesse dizendo que as obras não têm valor, ele estaria se contradizendo.
Como Romanos 3,20-31 se Encaixa na Relação entre Fé e Obras?
Esta passagem ensina que a justificação inicial vem pela fé em Cristo, não pelas obras da Lei, mas isso não exclui as boas obras como resposta à graça recebida.
Isso fica claro em Romanos 6,1-2, onde Paulo diz:
“Vamos pecar, para que abunde a graça? De modo nenhum!”
Ou seja, a fé verdadeira leva a uma vida transformada, repleta de boas obras. Isso está em plena harmonia com:
Tiago 2,24: “O homem é justificado pelas obras, e não somente pela fé.”
Mateus 16,27: “O Filho do Homem retribuirá a cada um segundo suas obras.”
Efésios 2,10: “Fomos criados em Cristo Jesus para as boas obras.”
Refutação do “Sola Fide”
Os protestantes usam Romanos 3,28 (“o homem é justificado pela fé, sem as obras da Lei”) para dizer que as obras não importam. No entanto:
Paulo está falando sobre a Lei Mosaica, não sobre boas obras em geral.
Ele mesmo ensina que Deus julgará as pessoas segundo suas obras (Romanos 2,6).
Ele nunca diz que a fé exclui a necessidade de viver em santidade e praticar a caridade.
No final do capítulo (Rm 3,31), ele reforça que a Lei não foi anulada, mas confirmada em Cristo.
Se Paulo estivesse ensinando “sola fide”, ele estaria contradizendo o próprio ensinamento de Jesus, que disse:
“Se queres entrar na vida, guarda os mandamentos.” (Mateus 19,17)
Portanto, Romanos 3,20-31 não nega a necessidade das obras, mas ensina que a justificação inicial vem pela fé, enquanto as obras são a consequência natural dessa fé viva.
Conclusão
Romanos 3,20-31 não contradiz a necessidade das obras para a salvação, mas apenas ensina que a justificação não vem pela Lei Mosaica, e sim pela fé em Cristo.
A fé não anula as obras, mas leva a uma vida de boas obras (Romanos 3,31).
Paulo e Tiago estão em harmonia: Tiago enfatiza que a fé verdadeira se manifesta em obras, enquanto Paulo ensina que as obras da Lei não são mais o caminho para a salvação.
Essa passagem, portanto, não pode ser usada para defender o “sola fide”, pois ela não nega a necessidade das boas obras, mas apenas rejeita a dependência da Lei de Moisés para a salvação.
Portanto, a salvação vem pela graça, através da fé, mas essa fé deve produzir frutos, ou seja, boas obras que serão julgadas por Deus. 🙏
Por Minha Fé Católica - 16/04/2025
Livro Clássicos da Teoria da Tradução - Volume 4 Renascimento - NUPLITT, pág. 99 ↩︎